sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Madame Bovary não sou eu

Medo de me descobrir e perder a inspiração. De me encontrar e me perder, sabe?
Criou-se uma aversão ao ordinário, ao usual. Não é de hoje, de fato, essa necessidade nas pessoas em ser únicas, insubstituíveis. Chega a ser assustador. Mais assustador, eu diria, talvez seja a proporção que isso tomou nos “tempos modernos”.
“Moderno” em si já é um conceito tão efêmero quanto minhas dietas. Tudo já foi moderno um dia, tudo um dia o será. Contudo, nada mais digno, não é mesmo? Pessoas têm o direito de rotular coisas do presente, “modernas”. É legal achar que se é inovador, faz bem ao ego, é divertido, até gera lucro, gira a roda da economia e etc.
Acredito que o mundo ter se tornado um enorme clichê tenha despertado esse sentimento de querer destacar-se, que é eminente nas pessoas. Há uma bagunça filosófica aí, pois o clichê generalizou de tal forma que quem não quer tornar-se um, acaba sendo por querer não o ser. Fugir do clichê se tornou o maior dos clichês! E até quem defende esse pensamento, como eu, acaba se tornando um clichê por não querer o ser, ao dizer que fugindo da própria fuga do clichê nos tornamos um. Entendem? Me perdi também.
Não sou diferente. Tranquilamente, sou como todas as outras.
Não sento, não rolo, não dou a patinha. Não faço pose de difícil, não gosto de Beattles e tenho mau hálito pela manhã. Sou normal e sem graça.
E o engraçado é que as pessoas, no intuito de destacar-se, inclusive, tendem a dizer que são sem graça pra diferenciar-se de todas as outras que o são, mas não dizem.
O fato é: sou normal mesmo! Não sou cult, nem nerd, nem hipster, sou Jéssica com CPF, RG, certidão de nascimento e alguns autógrafos da Gadú. Sou monótona, meus amigos são monótonos – mentira gente, cês são tri - meu blog é uma merda, pare de ler já!
E daí que todo mundo gosta das músicas que eu gosto? E daí que só eu gostava de fulano de tal e agora todos gostam. Não deixou de ser bom por ter popularizado, por deus, qual é o problema de vocês?!
Na luta para se tornar diferentes, que todos me parecem iguais. Cotovelando-se pelo destaque em meio a multidão.
Imagina que a raiz de toda a particularidade seja o defeito, a deformidade, a desregularidade.
Me flagrava pensando que a diferença estaria na perfeição, naquilo que é retilíneo, uniforme. Claro, partindo do princípio que a maioria esmagadora das pessoas é mais defeituosa que uniforme. O problema daí seria atingir a perfeição.
Uma alternativa seria ir acumulando pequenas perfeições.
Eu perfeitamente sei escovar os meus dentes. Eu perfeitamente sei fazer uma careta engraçada. Perfeitamente sei amarrar meus cadarços sem cantar a música do coelhinho. Perfeitamente sei falar demais. Perfeitamente sei não falar nada. Perfeitamente sei de cor a letra de “Águas de Março”. Perfeitamente sei chorar em filme. Perfeitamente sei não gostar de cachorros, nem de crianças, nem de velhos. Perfeitamente sei ser comilona, e gorda – pré-quase-semi-magra, é claro.
De perfeição em perfeição, poderia-se chegar a ser único. O problema seria, então, isso ser um tanto impraticável.
Defeitos ecoam, bem mais alto que qualidades. A particularidade, ao meu ver, está no erro, na falta, na ausência, no silêncio, na merda (mamãe, na merda).
A verdadeira particularidade. Aquilo que faz diferença. Uma diferença que faça, realmente, diferença. Uma diferença não-clichê. Não a roupa que usa, o lenço seu que é mais colorido que o meu, a sua música que é mais conceituada que a minha, seu humor que é mais ácido que o meu.
Quando a peculiaridade numa pessoa se tornar tão dela, que tudo nela envolvido remeter-me àquilo, aí sim, será uma diferença que eu darei valor; que acabarei concordando com o resto do mundo em apreciar essa tal particularidade, ou até mesmo em querer moldar-me a ela.
Não sei se cresci ou fiquei chata. Ou ambos.
Meu medo reside em acabar descobrindo meus defeitos mais profundos, saber consertá-los, e perder a identidade. Receio de mudar drasticamente. De me tornar irreconhecível, de ter de adquirir novas qualidades e aprender a vendê-las ao mundo. Não sei até que ponto consigo somar irreversibilidades sem déficit de Jessiquicidade.
Sei que por mais desconfortável que seja mudar, se for para evoluir, que seja. Quem não evolui, regride. Ficar estagnado é, sim, regredir.
Medo é particularidade? Não. Admiti-lo, talvez o seja.
Mas eu realmente tenho mau hálito pela manhã.


"... que apesar de termos feito tudo o que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais."
(Como Nossos Pais - Elis)

6 comentários:

  1. NOSSA vc escreve super bem, hein!
    Amei o texto :]
    beijos

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  2. como sempre, PERFEITO, melhor ainda quando tu lê pra mim né meuoo, tem toda uma interpretação diferente *-* hahahahah mas né, mesmo tendo comentado pessoalmente não podia deixar de comentar aqui:

    Ficou MUITO foda como sempre, ta escrevendo cada vez melhor e melhor e melhor, ainda vou ler muitos textos teus em jornais e livros aposto com qualquer um. Teu talento é mais que notável, me surpreendo a cada texto.

    Sou suspeito mas né, só ler teus textos pra comprovar isso

    te amooo <333333

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  3. Então tu sabes perfeitamente a letra de "Águas de março"? Mentira, vá!? huahuahuahua que inveja!

    Milena Greff

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  4. Quando a pessoa relê o texto e, mais uma vez, fica todo pensativo, como acontece geralmente quando eu leio os teus texto (tudo bem que esse é o segundo que eu leio na época em que foi postado, mas eu pretendo fazer disso um hábito).

    A leitura que tu fez em voz tem todo um diferencial, porque expressa, de certa forma, a tua interpretação,
    MAS
    aqui estou eu, de novo, interpretando o teu texto de uma forma que provavelmente, tá, de uma forma que MUITO provavelmente não é a tua.
    Mas enfim, ninguém é perfeito, não é?

    O grande problema da maioria das pessoas é sempre querer ser melhor e melhor e melhor e melhor e melhor sempre, não que eu ache que isso seja ruim, mas ter esse tipo de visão sem um propósito me parece idiota.
    As pessoas estão preocupadas em sempre serem diferentes, em sempre serem mais isso ou menos aquilo, mas muitas vezes se esquecem de simplesmente serem elas mesmas.

    Eu gostaria de ter o dom de me definir em poucas palavras, como alguns amigos conseguem (mais especificamente, um deles). Acho que esse "dom" dá à pessoa um ar de superioridade, um ar de intelectualidade, posso estar errado (e provavelmente estou, but who cares?)

    Eu considero o fato de alguém querer ser perfeito, um grande defeito. É humanamente impossível ser perfeito, todas as pessoas temos defeitos, alguns têm defeitos maiores, outros apenas um joanete (que pode acabar com a imagem de perfeiçãode uma pessoa em segundos).

    Eu sempre acreditei que as definições dos predicados de uma pessoa são muito relativos (sejam eles bons ou ruins).
    O que é defeito pra mim, pode não ser pra ti. O que é qualidade pra ti, pode não ser pra mim.

    Eu sempre tento ver as coisas de todos os lados possíveis, sempre tento analisar tudo de vários ângulos, sempre me coloco no lugar do outro antes de tirar qualquer conclusão (eu considero isso uma qualidade, mas vai saber o que os outros acham disso?!).

    Defeitos, muitas vezes, têm um peso incrivelmente maior que o das qualidades (o que me parece, no mínimo, injusto). Mas é como o mundo é. Isso pra mim é algo ruim, mas pra alguém pode ser bom, o que mais uma vez remete ao que eu falei antes, o que a mim cheira bem, ao outro pode cheirar mal.

    Não há uma pessoa no mundo que seja perfeita, acho até difícil achar uma pessoa quase perfeita (apesar de que ultimamente eu tenho conhecido algumas que chegam bem perto disso).

    Só sei que se eu continuar comentando eu vou ficar aqui pra sempre.
    Eu não acho os meus comentários dignos, mas essa é só a minha opinião.
    A dos outros pode ser completamente diferente.

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  5. NOSSA ! *_* É mto legal quando vc encontra um texto em que o autor expressa muito melhor seu pensamento so que vc !

    Bjs parenta ! ;)
    Luana Bixcoito Motta

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