quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Chapeuzinho Vermelho

Ué.
Acordei magra e de cabelos e olhos castanhos. E que quarto estranho esse, tão... colonial, diria quase bucólico. Será que eu bebi ontem à noite e adormeci na casa de alguém? Com os olhos apertados, saí à procura de alguma janela e achei. Senti minhas pupilas praticamente afundarem-se para dentro do crânio; entendido, era dia. Virei o rosto e logo notei que havia um espelho ao lado da cabeceira da cama. Fui aproximando-me, pé ante pé, até que a imagem à minha frente refletisse alguém que não era eu, mas acompanhava meus movimentos. E que espécie de chapéu vermelho cafona é este?
De súbito, alguém abre a porta e grita:
- Chapeuzinho vermelho, venha tomar café para levar esses doces para sua vovosinha!
Ora, vejam só, um sonho. Minha mente anda desocupada o suficiente à ponto de sonhar que EU haveria de ser a Chapeuzinho Vermelho em meu subconsciente.
Pois bem, se eu era Chapeuzinho Vermelho, aquela deveria ser minha mãe. Olhei para ela, que já havia saído porta afora batendo os tamancos, e notei que dona Neila não era. Corri atrás dela. Ah, faça-me o favor, Jéssica, Rita Lee não! Sim, em meus sonhos Rita Lee era minha mãe, e tirava os biscoitos do forno enquanto escrevia “Pagú” que dizia ser em minha homenagem.
Acredito que na história original, a mãe da Chapeuzinho não a deixava sair sozinha, porém, no meu sonho, ela não só deixava como mandava-me ir pelo atalho da floresta que andava lotado de cogumelos para fazer chá e dar um barato legal.
Quando dei por mim, já estava pela estrada afora, bem sozinha, levando aqueles doces para a vovozinha; que mora longe e o caminho é deserto, e eu já começava a ficar nervosa a respeito do restante da música.
Ao que me parece, meu cérebro estava levando o roteiro em questão a sério, que me leva a crer que o meu fim era próximo e envolvia afogamento em líquidos gástricos de lobos. Não me preocupei tanto com isso, afinal, sempre que me aproximo da morte em sonhos, chacoalho a perna e acordo.
Andava, colhia alguns cogumelinhos cor-de-rosa e cantava “Shimbalaiê” pela estrada. Foi quando dei de cara com um homem. Estranho. Alto, com cabelos longos até os ombros, barba cheia e vestia uma camiseta do SPC. Ah, claro, esta era a maneira que meu subconsciente resolvera representar o perigo e o risco que a vida traz consigo.
Saí desvairada, largando até os biscoitos e cogumelos pelo chão. Nem sei o porquê de eu correr tanto do pobre rapaz; é provável que eu – Chapeuzinho Vermelho – estivesse em dívida lá pelo bosque.
Antes que eu tivesse tempo suficiente para pensar em para onde correria, esbarrei em outro homem. Ah, o caçador! Bem a tempo, hem. Olhei para cima, no intuito de reconhecer-lhe a feição, e... oi? Rainier?
Ranier é o padrasto do Rafael, para quem não o conhece. A personificação de toda a masculinidade existente. Não há conhecimento que ele não domine, nem tampouco domínio que ele não conheça. Na casa do Rafael, ninguém toma Paracetamol porque o Rainier usa uma técnica chinesa avançadíssima, que só ele e o Ching-ling que a inventou conhecem, que alivia a dor de cabeça; antes mesmo de doer, obviamente. É provável que ele tenha cerca de 400 anos, graças às células-tronco que ele mesmo retirou do seu próprio cordão umbilical e se aplica em injeções regulares desde a infância, e hoje, luta pelo seu quinhão na patenteação das pesquisas.
Enfim, de alguma maneira, estava ele lá, no papel do caçador que salvará a minha vida das mãos do moço-cabeludo-do-SPC.
-Rainier! Me ajuda, esse cabeludo quer me cobrar!
-Cama aí, Jé – dizia ele – vou falar com ele.
Me acalmei. Deixei-o cuidar da situação. Estiquei os ouvidos e só consegui ouvir uns “pa pa pá”, “não sei o que” e “essa guria é duca, velho, devolve os biscoitos dela!”.
Eu estava até impressionada, meus sonhos na maior parte das vezes seguem um rumo totalmente sem sentido, enquanto este sonho já durava lá sua meia hora e tinha um certo nexo. Muito próprio de ser, mas tinha. Eu, inclusive, estava magra! Me deu vontade de sair desfilando pelo bosque de calcinha e sutiã. Comecei a curtir toda a excentricidade daquilo tudo.
Era um sonho, não era? Tudo é possível – e o mais legal é quando me dou conta disso antes de acordar.
Olhei para o cabeludo, assoprei e ele desapareceu, com direito a deixar rastros de purpurina e tudo. Olhei para aquele bosque, para aquele chapéu horrível, para aquela história tosca, e transformei tudo em Londres. Com tempo chuvoso, e muito dinheiro no meu bolso.
Levei um tapa. Acordei. Com meu corpo, meu olho e meu cabelo.
Meu corpo sentado sobre uma cadeira do teatro da “Chapeuzinho Vermelho” que eu havia ido assistir com a minha prima de dez anos de idade, meus olhos inchados e meu cabelo bagunçado pelo tapa que eu havia acabado de tomar dela, me chamando para ir embora.
Cair no sono em peças de teatro não é, provavelmente, a coisa mais educada a se fazer. Porém, em questões de entretenimento, a peça poderia até estar bem legal, mas nada vence um sonho onde começa com eu sendo magra e filha da Rita Lee, e termina em Londres. 
Pensando bem, vou dormir de novo.


"Nem me crie mais problemas."
(Trajetória - Maria Rita)

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

De Corpo Presente

De mansinho, pé por pé, catei uma cadeira e me sentei.
Saltos altos não são muito convenientes quando se quer andar sem ser notada e só me dou conta disso no exato momento em que estou sendo notada. Ouvi dizer que essa história de andar empuleirada em saltos surgiu na corte francesa, em meados do século 17. Também ouvi que antes disso os chineses já utilizavam sapatos altos – o que é bastante óbvio, todo mundo sabe que nós ocidentais somos seres subdesenvolvidos, somente capazes de usufruir das criações orientais. Mas nem chineses nem franceses consideraram o constrangimento, e toda a vermelhidão facial, que os poc poc poc do meu salto estavam causando enquanto eu chegava atrasada ao auditório – vou meter um processo nesses gringos por, sei lá, desequilíbrio-do-fluxo-sanguíneo-causado-pela-concentração-de-sangue-na-face-em-detrimento-do-resto-do-corpo.
Enfim, fingi que nem liguei pro pessoal me olhando e me ajeitei na cadeira. 
Descobri que havia perdido a parte que mais gosto em formaturas: a entrega de canudos. Um misto de tristeza por ter perdido as músicas clichê e depressão por saber que agora só restavam os intermináveis discursos dos paraninfos por vir, tomou o meu ser. Como eu, que havia passado a semana toda com vontade de ouvir “A Estrada” do Cidade Negra e “Pescador de Ilusões” do Rappa, poderia ter chegado atrasada o suficiente para não acompanhar a entrega de canudos? Inaceitável. 
Num intuito de autoflagelação, decidi que iria prestar atenção em cada palavra proferida pelos oradores e paraninfos.
Chamaram o orador da primeira turma – havia mais de uma. Até o momento, nada de crises de deficit de atenção. Agradecimentos aos colegas, professores, diretores, funcionários da biblioteca, faxineiros, guardas noturnos e fiscais do estacionamento da padaria da frente da faculdade. 
Foi quando a moça sentada à minha frente resolveu soltar o cabelo. Loiro e longo. Cor? Básica, mas legal. Corte? Péssimo. Todo mal repicado, torto, certo que fora cortado com a tesoura sem ponta da Eliana que vem com a sandália. Ih, dispersei. Meu pensamento já estava longe, longe o bastante para não ser preso por ter imaginado algumas inconstitucionalidades para com o cabeleireiro daquela loira.
Pronto, voltei a atenção ao palco.
Mas que palco legal, hem? Luzes legais. Decoração de formatura é sempre mais ou menos a mesma, mas aquela estava mais luxuosa; mais tecidos espalhados pelas paredes e flores naturais por todos os lados. E que chão bonito... tão... reto. Que trabalhão deve dar construir um auditório. Será que o pedreiro que construiu, tijolo sobre tijolo, essas paredes imaginou que tantas pessoas se formariam ali? Será que ele sabia que seria para esse propósito? Tijolo é uma palavra engraçada, não é mesmo? Ih, dispersei de novo. Volta, Jéssica.
Ok, agora quem falava era uma das 8765435678765 paraninfas, e aparentemente estava findando o discurso.
Típicas piadas internas, sarcasmos e eufemismos em geral. Tudo que é relativamente comum em uma sala de aula, vira mágico colocado em palavras rebuscadas de uma bela oração. Parei de ouvir as palavras da paraninfa quando resolveu usar a palavra “sublime” e “questionamentos em aula” na mesma sentença. Não respeito quem tenta transformar o dia a dia estudantil em uma epopeia digna de Camões. E também não respeito quem usa a palavra “sublime” em qualquer situação que não envolva a descrição de alguma sobremesa.
Comecei a lutar com meus pensamentos. Enquanto ele tentava com todas as forças focar em qualquer mosquito que ali passasse, eu o trazia imediatamente de volta. 
A moça do cabelo picoteado atraía meus olhos, e logo eu chacoalhava a cabeça e me concentrava nas palavras do mestre de cerimônias. Eu era puxada em duas direções. Cabelo. Discurso. Decoração. Palmas. Que cadeira bonita. Iremos agora fazer uma homenagem aos pais dos alunos. Bá, esse teto é de gesso puro. Peço que se levantem para cantar o hino rio grandense. Nossa, como minhas pernas são brancas. Declaro agora encerrada esta solenidade.
Oi? Acabou? Ok, vamos pra pizzaria.




"E eu querendo querer-te sem ter fim."
(O Quereres - Caetano)

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Detalhes

Porque será que escrever requer prática? 
Se bem que escrever em si, só requer alguma alfabetização, enquanto escrever qualquer texto consistente – que pode não ser o meu caso – requer, além de prática, disposição mental, criatividade, e, por vezes, paciência.
Cá estou eu. 
Sentada na sacada do meu apartamento, assistindo o cursor do editor de texto piscar, na esperança de que minhas conexões com o Xico Xavier voltem ao seu trânsito regular para que eu atualize esse blog abandonado – e assim, pare de escutar desaforos de todos os lados por tê-lo deixado às moscas.
Portanto, caros leitores, informo-lhes que não abandonarei este blog, como já fiz com outros ao longo da minha adolescência conturbada, e estou aqui, com todo a minha jessiquicidade, para resumir três meses de sumiço. 
E vocês ainda terão que ler besteirol acumulado. É, minha gente... consequências da alfabetização indiscriminada.
Resumir coisas nunca foi exatamente a minha especialidade. Acho que, de fato, nada deveria ser submetido a sínteses e compilações. Os detalhes da história que a fazem interessante. Creio até que omitindo detalhes, estamos sujeitos a descaracterizar a coisa toda. Entendem? A coisa! Aquela coisa toda, envolvendo aquilo tudo. Explico-me.
E se eu resolvesse omitir que nesses três meses de ausência blogueira, eu mudei a cor do meu cabelo? Estaria, consequentemente, omitindo a morte do Rafael, que hoje descansa em paz, depois de ter sido encontrado boiando no Guaíba por ter escurecido o meu cabelo.
Se eu omitisse que em SP fiquei jogando conversa fora enquanto a dona Mariana ocupava-se com suas prioridades, a minha provável moradia pelo resto da minha vida em SP também estaria sendo omitida. Quase perdemos o voo e não é nem necessário dizer que dinheiro para um próximo voo não haveria; nem para o próximo do próximo, e assim sucessivamente até alguns meses posteriores à nossa, minha e da Mariana, venda de corpos. E na venda de corpos, eu saio na frente por ter mais quantidade de massa por cm², não seria justo.
E se eu omitisse que acabei adquirindo um hábito horrível de trocar o dia pela noite? Bem, sem este detalhe, não haveria nem texto, nem layout novo; nem atualizações de blog abandonado, nem besteirol acumulado.
Os detalhes da minha vida fazem toda a diferença; mudam a coisa toda. 
Entendem? A coisa! Aquela coisa toda... Ok, deixa pra outra hora.




* * *
Sessão #beijomeliga:
me dei conta de como essa sessão é tosca, então só vou mandar meus beijos e abraços pra no próximo post já eliminar isso, pelo amor de deus, muito cafona u.u
beijo pro meu mariudo Rafa 
beijo pro Gi
S2 GR S2


COMPLETEI A CAFONICE OK ME DEIXEM


* * *
Sessão #subnick:
porra, é um troço mais tosco que o outro, mas ok, vá lá:


"... basta eu encontrar você no caminho."
(Caetano Veloso)